terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

O BANDA SÓ - FIM

        

            Já mocinha com seus quinze anos ela não pode mais segurar a paixão desenfreada por José da Lina, o Zequinha do Capuamo, homem dos seus quarenta anos, bem casado e pai de três filhos. Não sabia nem falar como essa paixão tinha começado, sabia apenas dizer que foi baixar os olhos no tal para seu coração bater aos supetões dentro do peito. Sabia também que era correspondida porque o José da Lina quando a via não desgrudava os olhos dela.  Agora com a morte da Avó Anjinha, única pessoa que ela devia respeito, pois o resto da família não estava nem ai para ela, não tinha mais a quem prestar contas. Foi quando a paixão incontida Zequinha tomou proporções alarmantes. O homem vez por outra vinha assistir jogo de futebol no Campo da Roça dos Pereira, onde o jogo de bola era uma coqueluche nos dias de domingo. E foi em um desses domingos que Lucinha se entregou a Zequinha do Capuamo em plenas areais do Banda Só. Lucinha foi feita mulher nos braços do homem que a fazia sentir calafrios por toda a pele de seu corpo quando o via. A moça nunca fora tão feliz, e o fato por si só não trouxe conseqüência nenhuma para Lucinha. Para a família, principalmente a mãe, ela nunca passou de uma iludida da vida. O problema foi o Zequinha.

          Zequinha do Capuamo, pai honrado, zeloso com os filhos e trabalhador, foi só ter possuído Lucinha jogou tudo pelos ares de supetão, casa, mulher e filhos. O alvoroço só não foi maior por que ele deixou todo o possuído para a família, saindo de casa apenas com a roupa do corpo para se instalar na casa dos pais, exatamente na Roça dos Pereira.. Como foi tudo de repente,  quem poderia entender a razão daquilo tudo? Ninguém de juízo perfeito chegava a conjecturar o porquê de tamanha loucura de Zequinha. Seria as voltas que o mundo dá na vida da pessoa sem ninguém esperar? Mas uma pessoa sabia perfeitamente o que tinha acontecido, o seu Jacó. O homem tinha se imbeiçado por Lucinha desde aquela boca da noite no Banda Só, a ponto de enlouquecer como um cachorro doido no cio.

              Lucinha ainda procurou contornar as coisas.

        - Mas Zequinha num precisava largar mulher, casa e tudo, homem! Eu só quero ser tua, e mais nada!

           Mas Zequinha dizia com convicção:

        - Num posso ser dois, Lucinha. Vou viver só com você. Foi, então, que a vida dos dois virou um inferno! Eram ameaças, pragas e violências verbais partido de todos os lados. As pessoas que conheciam aquele casal e amavam a bondosa esposa de Zequinha, tão perfeita e bondosa, viraram as costas para Lucinha. Intrigaram-se com a moça a sangue e fogo.

        - Mas também tu queria o que, mana? Respondia a irmã Tina, quando interrogada por Lucinha – Tu acabou com a vida daquela mulher!

        - Não precisava disso, Tina!

        - Pois agüenta que vem mais por aí, viu!

          Lucinha passou a ficar enclausurada em casa sem poder sequer tomar banho no Rio Corrente, um dos únicos prazeres de sua vida na Roça dos Pereira. Fazia assim não pelo que tinha feito, longe disso. Ficava em casa muito mais para pensar sobre o rumo a tomar a partir dali.

         Os pensamentos de infância quando ia ao Banda Só deixar o pai para viajar, quando ficava bom tempo com vontade também de pegar aquele ônibus e viajar para lugares distantes, tornara-se agora coisa presente, uma necessidade quase imperativa a povoar sua cabeça. O povo da Roça dos Pereira estavam expulsando-a do lugar como uma cadela sarnenta, virando a cara para ela e evitando-a de todas as formas. Aquilo se não lhe atingiam o corpo, magoavam profundamente seu coração. Da Lucinha querida por muitos, fizeram-na uma fera presa, maltratada e fustigada. Ela não podia agüentar tanta hipocrisia, pois conhecia  muitas de suas amigas que os rapazes da Roça não cansavam de amassarem seus peitos e meterem o dedo em seus priquitos, quando muito delas tinham pegado bucho, e estavam todas ali para contar história. Ela mesma nunca tinha feito aquilo com rapaz nenhum, ainda que eles dissessem fazer com ela a mesma coisa que faziam com as outras.

           Mesmo com todo tipo de cerco e vigilância sobre os dois Zequinha nunca deixara de dar um jeito de se encontrar com Lucinha, e nesses encontros, além de se amarem loucamente conversavam sobre a ira e os ressentimentos dos moradores da Roça dos Pereira contra eles. Em um desses encontros Lucinha disparou.

         - Vamos embora daqui, Zequinha! Aqui já era, viu.

            Zequinha não respondeu, e mudo ficou por minutos.

         - Deixa esse povo falar, Lucinha. Isso vai passar.

              Mas não passou. A situação dos dois só piorou, quando a imagem dos filhos menores de Zequinha era jogada na cara do pai, um ordinário que os tinha abandonado sem dor nem piedade por uma moça da cabeça virada. Lucinha sentindo que Zequinha não queria outra vida a não ser aquela da Roça dos Pereira, sentiu o amor se esvaindo de seu coração. Para ela era hora de tomar as redes de seu destino e tomar o rumo do Banda Só. E foi isso que fez em um raiar de dia brilhante, quando o agora expresso de luxo parou no Banda Só.

            Ninguém estava ali para se despedir dela, nem a mãe e, principalmente,  Zequinha. Apenas a irmã Tina acompanhou-a, calada e triste. Nada para dizer ou recomendar. Uma lágrima solitária caindo de seu rosto. Ela também não deixou de notar os olhares de seu Jacó na porta de sua casa quando se dirigia ao Banda Só. Talvez para certificar-se de que realmente ela tinha se ido.

         

               

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