sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

O BANDA SÓ - I

           

                 O Banda Só era o lugar onde os moradores da Roça dos Pereira e de outros lugarejos ao seu redor, como o Pajéu, Lagoa de São Francisco e  Centro dos Gomes, esperavam pelo ônibus para a capital, ou para outras cidades do Estado. Um ponto de areias brancas e grandes pedras, algumas servindo de assento, faziam do Banda Só uma referencia a todas as pessoas que quisessem embarcar ou desembarcar na Roça, mesmo para aquelas que nunca tinham pisado naquele pedaço de chão. O Banda Só era o ponto mais conhecido de passageiros num raio de muitas léguas.

                  Desde pequena, ainda uma molequinha, que há pouco deixara de chupar o pipo amarrado em um pano, Lúcia Maria, a Lucinha, se acostumara a idas e vindas ao Bando Só, ás vezes para ver o pai ir para a cidade de Pedro II outras para  curiar, com outros meninos, as pessoas viajarem para a capital. Nessas vezes era até um passatempo. A lembrança mais forte dela daqueles tempos era o apito do ônibus e sua entrada magistral na curva do Banda Só, onde todos esperavam ansiosos. Uma ansiedade que se desfazia em abraços, alegria ou lágrimas, ao verem o carro, dependendo de quem ia viajar. Nem mesmo a poeira imensa da estrada de piçarra e barro trazida pelo carro, impedia de todos ficarem ali, até ônibus partir e sumir na estrada.

                 O apito do ônibus sempre a mesma hora, certo como o raiar da luz de todos os dias, não ficara apenas na cabeça de Lucinha, mas na memória de sua geração inteira. Na Roça dos Pereira, era um tormento não ouvir o apito do ônibus diariamente ás seis horas da manhã, quando passava no Bando Só com destino a capital, e as cinco horas das tarde, retornando para Pedro II. Era o aviso de algum tipo de contratempo acontecido com o transporte, o que certamente acarretava a tristeza de alguém que não viajara, adiando assim o sonho, quem sabe, acalentado a muito tempo. Quantas vezes  cavalos,  burros ou jumentos conduzidos por parentes vinham esbarrar no Bando Só, para deixar seus entes queridos e suas bagagens de viagem, vindos de diversos lugarejos do sertão. A falta do apito do ônibus, então, tirava o sono de muita gente da Roça, sempre curiosos a se postarem na frente de suas casas de passagem obrigatória para a estrada, só para espiarem quem partia e, se conhecessem algum deles, até engrossavam a comitiva até o Banda Só. Tudo isso fazia a história daquele lugar.

            Se alguém tinha dúvida sobre quem tinha viajado, seu Jacó, como o mais respeitado e acreditado informante da Roça dos Pereira,  era o tira-teima.

           - Hoje não viajou ninguém conhecido – Sentenciava todas as manhãs em que as fofocas recrudeciam  acerca de quem tinha ou não tomado o ônibus.

             Histórias verdadeiras e lendas incríveis se misturavam sobre o Banda Só, confundido-se com a própria história e a crença popular da Roça dos Pereira. Dona Miroca foi quem espalhara há muito tempo,  jurando de pé junto e mãos postas, existir sempre alguém esperando o carro fosse dia ou noite, fizesse sol ou caísse chuva. Sem ninguém saber quem era. Seu Jacó não desmentia o fato dito pela comadre, mas também não confirmava a história deixando a dúvida na cabeça de todos. Alias a única dúvida que o homem fazia questão de preservar pois, como muita gente da Roça, ele mesmo nunca tinha visto  tal criatura no Banda Só. O silencio de sue Jacó era em respeito a dona Miroca.

            Não se sabe se dona Miroca inventara essa coisa  de visagem, aparições de outro mundo,  no Banda Só  para evitar tanta safadeza e sem vergonhice dos rapazes e moças da Roça dos Pereira que tinham eleito os lençóis de areias brancas do lugar para fornicar adoidados, fosse sob a luz da lua ou sob as trevas da noite. Para os jovens não havia outro lugar melhor, perto da rodagem e longe dos olhos de todos. Se o objetivo tinha sido esse de nada adiantara, pois os casais nunca viram nenhuma alma penada vagando pelo Banda Só. Por isso tome trepada. A única coisa que podia dar errado era uma das meninas chegar esbaforida em suas casas porque não aceitaram os afagos e amassos do namorado, querendo ir as últimas consequências. Essas podiam ter escapado de perder o cabaço, mas não escapavam da fama de já ter ficado no Banda Só. Fora assim com Lúcia Maria, a Lucinha.  

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