segunda-feira, 30 de setembro de 2019

UMA LIRA SERTANEJA - II


              Em 1865 começou a guerra do Paraguai. Herminio tinha 14 anos de idade e as notícias que chegavam ao Piauí eram terríveis. Como ele pertencia a uma família abastada, possuidora de brasões, muitos de seus parentes estavam envolvidos, de certa forma, com o campo de batalha, entre eles seu tio Teodoro de Carvalho Castelo Branco, o poeta com quem Herminio dava belas caçadas pelo sertão. Com o prolongamento da guerra ele embarcou  para a frente de batalha, quando completara dezoito anos, em janeiro de 1869. Foi reconhecido como primeiro cadete. Terminada a guerra ele permaneceu no exército, ganhando o posto de de 2º Tenente, incorporando-se ao 1º Batalhão de infantaria, em 1872. Como tenente voltou ao Piauí e casou-se com dona Clarinda Benvinda de Castelo Branco. Hermínio serviu nas guarnições de Uruguaiana e na corte, voltando para Teresina pelo vapor Paranaguá, em março de 1880, quando foi reformado.
               Herminio Castelo Branco foi o cantor poético de sua terra, dos costumes de sua gente, onde só lhe interessavam as lembranças do seu mundo, paisagens de sua vivência. Em suas andanças nada lhe conquistava mais o  coração do que os temas locais, como o vaqueiro, as caçadas, a farinhada e as festas folclóricas. Em Teresina, sua produção poética era publicada nos jornais O Semanário, O Telefone e A Época.
               Em junho de 1881, Herminio Castelo Branco juntou todas as suas produções literárias e lançou o livro Ecos do Coração. Suas poesias de cunho populares foram um sucesso e logo cariam no gosto do público, tendo o autor que publicar oito edições da obra. Mesmo se entendo que a tiragem dos livros eram pequenas não deixava de ser um feito grandioso. a última edição lançada pelo autor da obra citada foi em Fortaleza, no ano de 1887, quando ele mudou o titulo do livro para Lira Sertaneja. Seu livro definitivo. A Lira Sertaneja é composta dos seguintes poemas: O Vaqueiro do Piauí; Um Ajuste de Casamento Num Sertão de Farinhada; São Gonçalo nos Sertões; Recordações de Viagem; Na Sombra da Gameleira; Luar de Agosto; este Mundo é Um Rebolo; O Drama do Eleitor; A Maldita Quebradeira; Aos Rapazes Solteiros; Em Viagem ao Amazonas; À Margem do Rio Negro, e Canto dos Desterrados. Além do próprio livro Ecos do Coração foram juntadas outras poesias.
            Herminio Castelo Branco é o poeta do lirismo cabclo, das poesias bucólicas, de saudosa recordações de sua terra e de sua gente. Mas também é um poeta forte, denso, determinado, ás vezes até audacioso. Talvez herança do jornalista preocupado com o progresso da sua região e com o bem estar  de seus habitantes. O poeta popular também foi o responsável pela salvação da fantástica obra se seu tio Teodoro de Carvalho Castelo Branco A Harpa do Caçador, quando a fez publica em São Luís, no ano de 1884.
               As mordazes criticas de Herminio feitas ao governo da época vinham inseridas no meio de suas poesias populares, como estas quadras ainda atualíssimas chamada de Um Ajuste de Casamento Num Sertão de Farinhada:
                                         - Vê tu quanta diferença
                                            dos homens lá da cidade
                                            que nas tetas do tesouro
                                            té mesmo a socidade
                                            sugam, qual imenso polvo,
                                            o amor do pobre povo.

                                 - E nas casas do governo,
                                   que se diz repartições -
                                   Nas horas de expedientes
                                   (Com devidas exceções)
                                    Recebem todas as partes
                                    com tiros de bacamartes!

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

UMA LIRA SERTANEJA - I

            De sobrenome poderoso herdado dos senhores de sesmarias, Hermínio de Paulo Castelo Branco nasceu a 20 de janeiro de 1851, na Fazenda Chapada da Limpeza, municipio de Esperantina, na mesma casa grande construída por seu bisavó, Miguel de Carvalho e Silva, natural da Bahia. A linguagem de Hermínio já deixava antever o futuro poeta, pois era neto de Leonardo Das Dores Castelo Branco, o revolucionário alferes da Independencia do Piauí, depois inventor do moto-contínuo, e sobrinho de Teodoro de Carvalho Castelo Branco, cognominado de o poeta caçador.
           Hermínio Castelo Branco não conheceu a bonança da familia, nasceu quando as senzalas da casa grande já davam sinais de esvaziamento e a fartura já não era tanta. Talvez isso tenha feito o menino prestar maior atenção a tudo que ocorria a seu redor: aos caboclos, aos vaqueiros e roceiros, seus costumes e suas crenças. o poeta iria pintar em sua obra esses tipos como nenhum outro autor piauiense o fizera até ali. Morador de casa grande do interior, Hermínio acompanhava a movimentação do plantio e das colheitas dos legumes, das frutas de época, quando o homem do campo armazena cereal no final de inverno para comer no verão.
            Foi do tempo de menino as lembranças da casa de farinha, do forno quente para fazer beijú com coco, da luz no céu iluminando o terreiro e dos cantadores e emboladores que alegravam o serão das espremedeiras de mandioca.
             Essas imagens ele colocaria no poema "Um Ajuste de Casamento Num Sertão de Farinhada".
                             
                                            Velhos, moças e rapazes,
                                            Sem ordem, sem distinção,
                                            Ali, em roda, sentados,
                                            Sob apostas inocentes,
                                            Raspam mandioca ligeiro
                                            Com seus quicês amolados.

                                 Dum lado numas gamelas,
                                 Três mulheres ocupadas,
                                 Com os braços seminus
                                 Em tirar a tapioca,
                                 Espremendo a fresca massa,
                                 Para fazer os beijus.

            As imagens tipicas de uma casa de farinha aí estão com perfeição contada por Hermínio num dos livros que compõem A Lira Sertaneja, onde num lugar chamado Soledade, uma mocinha matuta por nome de Maria da Conceição, filha de um Zé da Mata ajusta casamento com um tal de Manuel Baixão Fria. Tipicos personagens nordestinos.
             Quando mais crescido Hermínio Castelo Branco começou a iniciar-se na poesia popular, no desafio do repente ao som da viola, disputando pelejas com cantadores famosos como o embolador afamado Raimundo Dias, vencido por Hermínio numa peleja. O poeta se refere a este fato em São Gonçalo Nos sertões.
                                                   
                                             Eu não sou de brincadeiro!
                                             Pareço com marruá
                                             Quando refuga a parteira,
                                             Pela perna não me vencem
                                             Pelas armas é asneira.

                               Nunca vi couro de alma
                               Nem rastro de lobisomem
                               Sou cascavel de vereda
                               Onde pico, urubu come,
                               Sou raio, fogo,corisco,
                               Onde não tem São Jerome.