domingo, 23 de dezembro de 2012

        Festival de Música da Chapada do Corisco -CHAPADÃO. 


       Em 1995, eu Aurélio Melo e Henrique Costandrade tomavamos umas cervejas em um bar restaurante localizado perto da Praça do Liceu, se não me engano Bar e Restaurante Cearense. Naquele ano existia um Centro Integrado de Arte-Ciarte/Centro, Da Fundação Cultural Monsenhor Chaves, coordenado pelo ator Fábio Costa e o humorista Dirceu Andrade, este sim, em frente a Praça do Liceu. Era um Centro vivo com atividades de literatura, música, dança, teatro, artes plásticas e cinema.
       Eu era diretor do Departamento de Arte da Fundação Cultural Monsenhor Chaves, Aurélio era o coordenador de música e Henrique o coordenador do Caminhão da Cultural, um dos mais arrojados programas da Fundação, que era presidida por Dona Eugenia Ferraz. O Caminhão era equipado com som, luz, palco e uma equipe de seis pessoas, servindo a inúmeras associações de moradores, grupos culturais e artisticos, e às atividades da própria instituição, levando música, dança, teatro e cultura popular a diversos bairros de Teresina.
       Estavamos exatamente vindo de uma atividade do Caminhão e paramos naquele bar para uma refrescada. Cerveja vai, cerveja vem surgiu a idéia de de realização de um festival de música permanente para Teresina, no entanto, um festival que fosse diferente de tantos outros festivais já realizados na capital. A discussão roulou acalourada, e a cerveja, também, mas gelada.
      Como diretor da Fundação comprei a idéia na hora. O festival seria realizado com uma nova dinamica: seriam quatro eliminatórias realizadas nos bairros de Teresina, com a final no centro da cidade; O jurado seria o mesmo para as quatro eliminatórias, e o festival seria realizado com o apoio da associações de moradores e artistas dos bairros visitados. A categorias concorrentes seriam amador e profissonal, com premiações distintas. Tudo acertado, precisavamos de um nome, algo impactante que aliasse identidade cultural e que fosse bom de markentig. Veio o veredicto final - Festival de Música da Chapada do Corisco e, como já estavamos chapados de cerveja, veio o subtitulo, chapadão. Assim nasceu o Festival de Música da Chapada do Corisco-Chapadão.
        Para viabilização economica do projeto contavamos com o bom transito de Henrique junto ao entao secretario de finanças da Prefeitura de Teresina, Dr. Firmino Filho, por sinal, hoje prefeito da capital. Foi batata. Lançado o edital do festival a áea musical de Teresina abraçou a idéia de uma forma surpreendente. Grandes músicos e compositores, cantoras e cantores piauienses participaram do Chapadão, que teve sua primeira edição em maio/junho de 1995.
        Bairros como Mocambinho, Dirceu Arcoverde, Parque Piauí, Bela Vista, Piçarreira, Ininga e tantos outros receberam  o evento com festa em praça pública ou nos ginasios poliesportivos. Lembro de nomes consagrados de nossa música que participaram ou foram descobertos pelo Chapadão, como Rubinho Figueredo, Marlon Rodnei, Ostiga Junior, Paulo Utti, André de Sousa, Frank Farias; com shwos nos intervalos de Gabi, Terra Francisco, Ensaio Vocal, Miriam Eduardo e tantos outros.
        Passados mais de dezoito anos o Chapadão mudou de formato, foi muito modificado, mas ainda continua um grande festival e bastante significativo para a descoberta de talentos na área musical. Neste ano de 2012, eu, Aurélio e Henrique recebemos, no final de sua 18º Edição, realizada no Teatro de Arena de Teresina, uma placa comemorativa pela criação do evento, entregue pelo Presidente da Fundação, o músico e advogado Marcelo leonardo e pala coordenadora de música, a cantora Luciana. Temos orgulho de algumas coisas na vida. Ter participado da criação do  Chapadão é uma delas.

domingo, 26 de agosto de 2012

                                                        TEMPO DE LEMBRAR.

                                                Os  Anos  Oitenta  e  o  Tempo da  Cultura  I.



             Em 1985 eu era presidente da Fetapi - Federação de Teatro Amador do Piauí, entidade que agregava mais de 40 grupos de teatro do Estado e que gozava de grande prestigio, sem dúvida alguma. Para quem sabia dimensionar sua força, o campo era aberto e vasto. Ao meu lado, na diretoria, estavam Pinho Gondinho, Lorena Campelo e Raimundo Dias.
             Naquele ano fizemos uma das maiores mostras de teatro do Estado. Lembro que o cartaz do evento, de cor rosea, criação do genial Paulo Moura, estampava um rosto caindo uma lágrima do olho.Eu e Pinho fomos pedir ao prefeito de Teresina, na época, Freitas Neto, que patrocinasse o cartaz e o folder do evento. Ele gentilmente nos indicou o assessor de comunicação para as providencas. O assessor queria mudar o desenho do cartaz por que era muito triste, na sua visão. Não aceitamos. O material foi impresso e a Mostra foi um sucesso.
           A Fetapi tinha sua sede na Fundação Cultural do Piauí, cedida pelo então secretario, Jesualdo Cavalcante. A entidade,  também,  recebia um salário minimo do orgão para sua manutenção. O país estava saindo da ditadura militar e nós tinhamos presa de fazer as coisas, e faziamos.
           1985 foi um ano de eleição para prefeito. Um dia fui convidado para comparecer ao auditório da Fundação Cultural onde haveria um encontro com o secretario. O encontro, na realidade, seria para comunicar que o secretario iria se candidatar a prefeito, pelo PFL. Por mais que o secretario fosse um homem competente, como foi realmente na pasta da cultura, não podiamos apoiá-lo. Era questão bem nitida entre direita e esquerda. Direita, então, jamais! No encontro eu disse aos amigos que não votaria no secretario, e sim no  professor Wall Ferraz, isso para deixar bem claro, de vez, minha posição. Não tardou para que a Fetapi passase a ser mal tratada dentro da Fundação e a perder as pequenas benesses.
           Em seguida, recebo um dia um convite do artista plástico Paolo de Lima, para comparecer a uma sala no Palácio do Comércio onde havia encontros de sedimentação de propostas para a campanha do professor Wall Ferraz. Fui lá e entreguei as propostas da Fetapi para a área da cultura. Entre nossas propostas estava a criação de uma fundação municipal de cultura para Teresina. Foi batata. Já existia uma intenção nesse sentido do professor e o responsavel em formatar o documento era o professor Manoel Domingues, do PC do B. Houve, então, várias reuniões com a classe artistica. O documento norteador da criação da Fundação Cultural Moonsenhor Chaves foi confeccionado, e temos ainda hoje uma cópia dele.
           O professor Wall Ferraz foi eleito e tomou posse em janeiro de 1986. Jamis pensei em trabalhar em um orgão de cultura, ainda mais ajudar a implantá-lo. Se bem que estava preparado para isso. Um dia recebo um recado do professor Noé Mendes para que eu o encontrasse na prefeitura. A reunião com ele foi na mesa grande de marmore onde o prefeito faz reunião com sua equipe. Noé Mendes era um grande amigo desde o meu tempo de estudante na UFPI, onde ele dirigia a Coordenação de Assuntos Culturais, Noé Mendes tinha sido nomeado Superientende da Fundação Monsenhor Chaves, que tinha como presidente dona Eugenia Ferraz, e naquele encontro ele me convidou para a coordenação de artes. Então, começamos ali mesmo a montar a equipe da Fundação e a visitar alguns locais em Teresina para alugar como sede do orgão.
          Fui imensamente feliz na indicação de alguns nomes da área cultural para a Fundação. O Noé aprovava com dona Eugenia. Pessoas de talento como Janete Dias, Heloisa Cristina, Valdery Duarte, Arimatan Martins, Raimundo Dias, Durvalino Couto, Edson Andrade Correia, Hélio Costaandrade, Fred Ramos iriam compor uma equipe inicial de implantação da Fundação. O local escolhido para o endereço foi na Rua Quintino Bocaiuva, perto da Escola Técnica Federal, hoje IFPI. Foi dali que se irradiou a partir do ano de 1986, uma maiores transformações da cultura na capital.
        A Fundação, inicialmente, impalntou 03 Centros Integrados de Arte. O Ciarte/Centro;  Ciarte/São João e Ciarte Matadouro, coma a criação do Teatro do Boi, inaugurado com um episodio fantastico, quando o professor Wall demitiu de cima do palco o músico Chagas Vale, instrutor de coral, por ter reclamado das condições exatamente do coral infantil que dirigia. Este fato deu manchetes e polemicas nos jornais,
        Nos centros de arte existiam bibliotecas, aulas de teatro, dança, capoeira, cultura popular e música. Também, foram criados 16 bandinhas de fanfarras; 08 corais infantis; O Festival de Bandas; O  Festival de Teatro de Bairros; Cinema nos bairros; O plano editorial do muicipio e a criação da revista Cadernos de Teresina. A Fundação, também, promovia shows com grandes nomes da música brasileira no Theatro 4 de Setembro, a exemplo de Nana Caymmi e Nara Leão. Tudo sob a batuta do setor de artes.
        Foi numa dessas grandes promoções que se desfez praticamente a equipe inicial da Fundação. Janete Dias idealizou o Fenemp-PI - Festival Nordestino de Música Popular do Piauí. Andou em vários estados brasileiros divulgando o evento e ganhou o patrocinio do Banco do Nordeste. Mas o evento foi impedido de ser realizado pela Fundação pelo prefeito Wall Ferraz, que alegou desvio de função do orgão. Discordamos dele. O professor Noé Mendes tentou várias vezes argumentar com o professor,mas ele não cedeu.
        Noé Mendes reuniu toda a equipe de artes e anunciou sua saida da Fundação. Eu,  Janete Dias, Edson Andrade, Hélio, deixamos a Fundação em solidariedade a Noé Mendes. O Fenemp-Pi foi levado para a Coordenação de Assuntos Culturais da UFPI e realizado por nós, que montamos toda a coordenação do evento lá dentro. O Fenemp´Pi foi realizado em maior de 1988 no Ginásio Verdão com imenso sucesso, tendo atração final do Quinteto Violado. Quem ganhou o Fenemp-Pi foi o Grupo Candeia.
A FCMC, apesar de ter saido no material publicitário, não participou da realização do Fenemp-Pi.
        Fora da Fundação Monsenhor Chaves retomei meus trabalhos na área de teatro, com mais afinco e paixão. E a história continua.       

sexta-feira, 29 de junho de 2012


                                 A DESLUMBRANTE CANTATA DE UM NORDESTE MUNDO.


              Muitas vezes é necessário deixar as lágrimas cairem para que nosso coração se abra de amor e esperança em tempos tão ásperos e dificeis. Sentir e deixar fluir em nosso corpo e mente a Cantata Gonzaguiana apresentada pela Orquestra Sinfonica do Piauí, sob a batuta do maestro Aurélio Melo com a participação do humorista João Cláudio Moreno, é um desses momentos raros de beleza e encantamento.
              Pode até parecer uma proposta arrogante misturar duas referências tão distintas, uma orquestra sinfonica, portanto, erudita, com a música gibão de couro genuinamente popular. No entanto, a mistura é absolutamente corajosa e a empreitada da diversidade ganha verdadeiro sentido de contemporaneidade, permitindo que explodam idéias novas e provocadoras.
              Chama a atenção a força que esse tipo de encontro entre duas formas que parecem desguais podem suscintar, gerando até a suspeita de que algo possa dar errado como, por exemplo, a qualidade técnica. São tantos instrumentos, músicos, uma parafernália na cena que ficamos apreensivos, mas no caso da Cantata Gonzaguiana tudo parece promover uma cumplicidade entre os criadores que fica visivel ao público, verdadeiro sentimento de prazer fazendo com que a música que chega a platéia fique na memória de todos muito depois do show terminado.
              Dois artistas, também diferentes Aurélio Melo, a simplicidade criadora e João Cláudio Moreno, a fúria do talento - e é bom que sejam diferentes - para que as escolhas se atraiam, as escolhas que podem ser estéticas, técnicas ou éticas, com as quais os dois artistas se comprometeram desde o instante em que decidiram traçar suas metas, seus caminhos para a sublime criação de um espetáculo tão grandioso. Como é bonito ver os rostos dos músicos na alegria contagiante e na generosidade de seus gestos, compartilhando plenamente do momento dos dois artistas.
              Segurar a emoção não é possivel e nem é bom mesmo, quando o som de violinos, sanfona, violoncelos e tantos outros instrumentos tomam conta do palco, construindo uma malha de pura sincronia que deslizam para o espaço, vibrando em cada corrente de ar levando em redemoinhos para as estrelas e as galaxias a música de um ser imortal, que tinha a voz forte e gutural, que parece estar ali à nossa frente, Luiz Gonzaga, o velho Lua, rei do baião, encarnado na pessoa de um homem, um ser pleno de luz, um artista genial, João Cláudio Moreno.
             Fechamos os olhos e a Cantata Gonzaguiana é o sertão de um nordeste mundo. Não vamos falar do repeertório escolhido, nem descer detalhes sobre o conjunto da obra, como arranjos, direção, outros signos do espetáculo.
            Vamos lembrar da força do artista piauiense na superação de tudo. Vamos lembrar de vaqueiros, caatingas, sabiás, anus, acauãs, asas brancas, exodo rural, seca. Vamos lembrar de terreiros, danças, oratórios, fé, forró, xotes, baião, rios e estradas de uma forma que nos toca profundamente, mostrados em um espetáculo para encantar a humanidade.

segunda-feira, 2 de abril de 2012



TEMPO DE LEMBRAR 3




Os Anos de Chumbo e a Verdade de Cada Um








O ano era 1976. Ainda não fazia teatro. Naquele ano eu comecei a escrever contos e a publicar em jornais de Teresina. Mesmo por que tinha ganho um concurso de contos promovido pela Fundação Cultural do Piauí, e publicado no Jornal O Dia, além de levar a bagatela de trezentos contos. Um espanto pra mim! Portanto, minha turma era o pessoal de literatura: contistas e poetas piauienses da geração mimiográfo. Foi naquele ano que minha cabeça começou a mudar em relação a ditadura que tomou conta de nosso país.




Claro, que eu já tinha conhecimento dos desmandos e das atrocidades dos militares, mas é que as coisas chegavam tão lentas e atrasadas no Piauí, que poucos iluminados se davam ao luxo de estar em dias com os últimos acontecimentos. Ainda mais que eu convivia com o pessoal do Cepi-Centro de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares, da Fundação Projeto Piauí, criada no governo Alberto Silva, que em plena ditadura investia uma grana preta em pesquisa educacional, música coral, artes plásticas, cultura popular e teatro, coisas que eu adorava. Portanto, era um período em que a cultura piauiense parecia viver num oásis em pleno país que a policia espancava atores, quebrava teatros, proibia músicas e prendia artistas. Por aqui quase não se tinha conhecimento que a ditadura tivesse feito seus estragos na própria classe artistica piauiense.




Minha mudança de rumo veio com os infindaveis papos nos botecos de Teresina, onde poetas, contistas, jornalistas, músicos e atores varavam noites em recitais, bebedeiras, namoros e, principalmente, resistência politica, tudo regado no mais sincero respeito um pelo outro. Onde o coletivismo substituia o individualismo e a luta era pelo bem comum. Criatividade à flor da pele. Longe dos botecos de hoje onde o ego e o individualismo de alguns assassinam e enterram ideias brilhantes de outros.




Veio 1977, e com ele minha entrada no mundo do teatro, quando fiz a estrea de minha primeira peça no Theatro 4 de Setembro, simbolo e orgulho de nossa cultura, que me deu o impulso de nunca mais parar. No ano seguinte, senti as garras da ditadura rondando ao meu lado. Minha segunda peça falava sobre um coronel latifundiário que era morto por um roceiro. Fui chamado na Policia Federal, onde o censor foi direto e grosso: "Pode mudar o final da peça. Um roceiro não pode matar um coronel, ainda mais por questão de terra". Caramba. Mas sem aquele final a peça não existiria. A sentença final do censor:"Então, não apresente a peça". Putz!




A peça era feito pelos atores Lili Martins, Afonso Miguel Aguiar, Lorena Campelo e Ribamar, não falei nada para eles. Na minha cabeça era uma estupidez aquela censura e cabia a mim resolver tudo. Negociei com o censor. No final da peça, faríamos apenas a menção que o coronel iria morrer e, antes que ele caisse, a luz se apagaria. Lindo, não! O censor enguliu, e mandou dois agentes assistir ao ensaio geral. Como o diretor era eu, ssim fizemos. Como raramente eles iam assistir ao espetáculo fizemos o texto do jeito que estava, e o coronel terminava estirado no palco,, morto pelo roceiro. Pura transgressão! Tempos depois essa peça seria assistida por Plinio Marcos, icone da dramaturgia brasileira, no Theatro 4 de Setembro, e quando eu fui apresentado ele me falou que seria melhor eu escrever um romance sobre aquele fato, pois assim eu contaria tudo que estava entrelinhas. Mass eu nunca escrevi romance algum.




Depois, já fregues do Departamento de Ordem da PF, pois fazia liberações de peças e eventos da Federação de Teatro Amador do Piauí, da qual era secretario, comecei a ter pavor e, ao mesmo tempo, ódio da ditadura. Duas ocasiões me marcaram muito naqueles anos. A primeira vez foi quando a Federação promovia o dia internacional do teatro. Distribuimos os convites do evento, feitos pelo querido amigo e ator Lili Martins, quando fui chamado à PF. No final do convite estava escrito uma frase: "Um beijo na bunda". Dessa vez foi de lascar. Um bafafá do caralho. O censor ficou irritado. Que era aquilo? Um beijo na bunda? Que mensagem era aquela? Vamos proibir esse evento, seu Campelo! Passei quase três horas conversando com o homem, e explicando que não tinha nada a ver, que era apenas uma saudação. Saudação com um beijo na bunda! Realmente era dificil de acreditar, mas foi tudo contornado. Mas aconteceu o pior, o Lili, irreverente que era, numa das cenas que fazia no evento em comemoração ao dia do teatro, sabendo que a PF não gostara do convite, arriou as calças e mostrou a bunda pra platéia. Risos gerais! Era o ano de 1980.




A outra vez, foi quando eu vinha do bar Sachas, templo dos artistas de teatro, que ficava ali na Avenida José dos Santos e Silva. Do Sachas só se saia ao amanhecer, Era uma eterna festa. Não sei por que eu cismei de ir embora ainda cedo. Andei pouco fui agarrado por um troglodita e jogado dentro de um fusca. Lá dentro estavam mais dois. Começamos a rodar em Teresina, e as perguntas eram repetitivas, e os tapas no peito eram horríveis, e o queimado no pulso com baganas de cigarros era uma coisa dolorida. Perdi a noção do tempo. Não sabia por onde andavamos nem tinha a minima noção do que queriam. Eu era apenas um rapaz querendo fazer teatro em Teresina. Ali estava a face mais escura dos anos de chumbo, vilipendiar e amedrontar. Me soltaram no centro da cidade quando o dia vinha amanhecendo. Corrir para casa. O pulso queimado e ardendo, chorando de uma raiva interna e de uma impotencia horrorosa. Contei pra minha familia. Muitos amigos do teatro e da literatura foram à minha casa conversar comigo. Ainda andamos por alguns lugares que passei, mas eu não me lembrava de nenhum rosto. A partir dali minha convicção ainda ficou maior de que deveria continuar no meu oficio de teatro.




E assim faço até hoje. Ano em que completarei, no mês de novembro, 35 anos de teatro. Vai ser uma festa!




quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Teresina, De carnaval, Ganhos e Cinzas.

2012 vai ser o ano marco do carnaval de Teresina, afinal de contas o nosso corso carnavalesco é o maior do mundo, segundo o Guiness Book, o livro dos recordes, mesmo que esse recorde pertença a nós próprios, por que o nosso corso da forma que é realizado é o ùnico no mundo. Enfim, temos alguma coisa só nossa, e no ano que vem vamos quebrar nosso próprio recorde! Mas vamos falar dos rumos que o carnaval de Teresina tomou e que vamos ter de conviver daqui pra frente.

Lembro que em 1997, foi realizado pela Fundação Mons. Chaves o Seminário: Reviver Carnaval-Rumos e Identidade do Carnaval de Teresina, com a participação de Cecilia Mendes, Paulo Vasconcelos. Bernardo Sá, Galba Coelho, Marcos Peixoto, Manoel Messias, Osvaldo Almeida, Daniel Aracacy, Jamil Said, Bosco e nossa participação, com uma platéia excelente. Estavamos em busca de retomar o carnaval de Teresina, e ali foi feito um dos melhores diagnóstico sobre nossa festa momesca. Depoimentos sinceros e apaixonados. Como surgiu nosso carnaval, qual sua contribuição e de como ele poderia ser. O Seminário serviu para traçar extratégias.

O carnaval de Teresina nunca teve uma identidade. Nossas escolas de samba foram criadas no rastro das escolas de samba do Rio de Janeiro, inclusive, importando luxuosas fantasias daquele estado para os desfiles daqui. Até mesmo o caminhão das raparigas, criado pelas mãos das prostitutas da antiga Paisandú, era mais um protesto, um grito de revolta por não poderem participar de bailes chiques da cidade. Transformado em corso, saiam pelas ruas de Teresina, depois foi substituido pelos blocos e pelas escolas de samba, também uma invenção do Rio de Janeiro, ainda nos anos de 1930. Lembramos que o corso, também, é uma festa excludente por que só participa diretamente quem tem carro ou quem pode alugar um caminhão.

Sem nunca ter encontrado sua identidade ou vocação, o carnaval de Teresina vive de momentos, nascendo e morrendo. Nem mesmo os sambas enredos das escolas conseguiram contar nossa história. Mas elas tinham uma tradição, afinal de contas desde a Escravos do Samba, nossa primeira escola, criada em 1952, já se vão mais de 60 anos. E acabar com o desfile das escolas usando argumento de que o povo não gosta é uma tremenda bobagem. Nem se discute, é estatisco, a maioria gosta. O que deveria ser discutido era o compromisso do Municipio e do Estado com o carnaval de sua capital, seu rumo, apoio e ganhos. Até que o municipio tem tentado, agora o Estado sempre foi omisso, como se a capital não existisse. Mas isso é o reflexo da maioria de nossa elite que vê a cidade de cima, por que elas não gostam da cidade, nem da cultura da cidade e nem do carnaval da cidade. Então, que se lixe. Mas tem, também o outro lado. E se as escolas de samba foram pras cucuias cabe responsabilidades de seus dirigentes que sempre agiram com amadorismo, com grandes egos e com brigas internas por migalhas de poder. Junte-se a isso, parte da imprensa, via colunas de jornais e midias eletronicas , que fazem tudo para denegrir a imagem do carnaval da cidade. As escolas de samba não desapareceram apenas por falta de apoio financeiro, mesmo por que é vergonhoso sair por outros estados dizendo que a prefeitura de Teresina se nega a destinar miseros 50 mil para cada escola, enquanto por lá briga-se por milhões. Pobreza nossa, não, é falta de grandeza mesmo, como se dinheiro destinado as escolas fosse salvar nossas mazelas e pobrezas seculares. Aliás, esse espirito parti das elites no poder que não amam sua cidade.

Daquele Seminário de 1997, foi recriado o corso carnavalesco em 1998, com o caminhão das raparigas representado por atrizes piauienses e um caminhão de apoio com convidados especiais. O corso cresceu e se transformou no que conhecemos hoje e as escolas de samba passaram a ter apoio oficial naquele ano, saindo do desfile realizado na Av. Frei Serafim para a Avenidade Marechal Castelo Branco.

O municipio de Teresina, via Fundação Monsenhor Chaves e Semel, por mais esforço que faça não tem conseguido se sobrepor aos atropelos e desencontros. Continua sempre com o mesmo nhem,nhem,nhem, cuidando apenas de reis e rainhas do carnaval, sem dimensionar o poder do povo da cidade, sua criatividade e seu entusiasmo. O corso foi um exemplo, quando o poder público perdeu as estribeiras e deixou a coisa rolar solta: foram dezenas de caminhões perdidos pela cidade, carteiradas de espertalhões em cima de guardinhas de transito e o povo olhando o nada, como se nada tivesse controle, ainda bem que o povo convocado e comparecido ao local suportaram cordeiramente aquilo tudo. Foi tudo lindo para lentes e cameras!

Ganhos para a realização do concurso de marchinhas de carnaval; para as previas de blocos, para a festa dos artistas, galo da madrugada, sanatório geral e para a promoção do carnaval por alguns bares de Teresina com artistas locais. Quanto aos desfiles dos blocos de sujos, a mesma desorganização no local, quando os que estavam ali invadiam a passarela e se misturavam aos participantes dos blocos e, pasmem, nem a banda de axé que tocava parava para se escutar os enredos dos blocos. Aliás, vamos encerrar com as tais Bandas. Muitos dirão é aquilo ali, pronto. Que maravilha, encontramos a identidade de nosso carnaval! Mas eu direi, pronto acabamos com o que restava de nossa esperança em encontrar algum resquicio de nosso poder de transformação pela nossa cultura. Pois a juventude bela e linda que dançava na Marechal Castelo Branco, com certeza, vai dizer que carnaval é aquilo ali. Afinal de contas, é um retrato de quem não conhece suas caracteristicas e sua vocação. No ritmo Bahiano chegamos lá. Axé, minha gente!

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

TEMPO DE LEBRAR
2
Anos 70, A Turma e os Apelidos.




Nos anos de 1970 quase todos os amigos tinham apelidos, ou codinomes, o meu era BD, e só os mais intimos sabiam o que siginificava. Tinha o Fuinha, o Sargento, o Til, o Lento, o Billy, o Maca e o Jota, este era o meu melhor amigo. Alguns apelidos eram inventados por mim e o Jota e os apelidados nem precisavam saber por que ficava entre nós mesmos. Nós curtiamos pra carabam inventar os codinomes. Foi com o Jota que vivi bons anos da minha juventude, onde tudo era descoberto de forma fantástica e compartilhado nos minimos detalhes. Aquilo que não sabiamos iamos atrás com uma curiosidade infernal. Algumas vezes nos davamos mal, mas nunca nos arrependiamos do que tinhamos feito. Apenas partiamos para outra.

No ano de 1973 eu estudava no Colégio Helvidio Nunes, onde a farda chamava atenção pelas cores fortes, a calça caqui e a camisa de um amarelo intenso que, também, ganhou o apelido de picolé de abóbora. Eu ia sempre impecavel para o colégio, desde o kichutte limpinho até a camisa super gomada. E me comportava como um verdadeiro estudante, e era mesmo, apesar dos amigos não acreditarem. Isso por que nos finais de semana meu comportamento era totalmente diferente, bebia toneladas de uisque Royal label, que era nossa cachaça e varava as noites atrás de festinhas e de cabarés. Jota se deliciava com aquilo. Olhando para a minha cara ninguém era capaz de acreditar no que eu seria capaz de fazer. Minha reputação no Colégio era muito grande, comportamento exemplar. Coisa de ser escolhido para pelotão da parada de sete de setembro. Uma parada dura. Sete de setembro naqueles tempos não era brincadeira, era coisa de patriotismo verde amarelo ditatorial. Faltar aquilo significava castigo certo. Se bem que o castigo era ensaiar a marcha dias e dias, e ainda por cima não poder beber vespera de feriado. Mas tinha muito estudante que adorava e sentia orgulho em ser pelotão. Jota não aguentava me ver marchando. Minha reputação como estudante ginasial foi além, pois fui convidado para ser vice-presidente do grêmio escolar. Eu mesmo não entendi porque. Quem me convidou para aquilo foi um dos meus melhores amigos, esse sim, popularissimo no Colégio, o Raimundinho Santana, para nós o Til, um cara fantástico acima do bem e do mal. Lembro de ter sido chamado na ddiretoria pelo professor Agnaldo Camilo que conversou comigo e confirmou minha participação na chapa do grêmio. Afinal de contas nada podia fugir ao controle da direção. Passei a ser importante. Foi muito interessante aquela experiência, que contarei mais adiante.

Jota era uma figuração, um cara muito loouco, como de resto eram todos os jovens interessantes daqueles anos. Não estava nem aí para estrutura nenhuma, mas era um verdadeiro amigo, divertido e sincero. Além de beber muito, o que não era novidade, tomava anfetaminas aos quilos. Como ele era gerente de fármacia ficava fácil. -"Olha, aí BD, uns optalidons." Eu recusava, por que detestava comprimidos desde pequeno quando mamãe me enchia deles para me curar de asma. Mas eu garantia suas loucuras no Colégio quando ele ia dopado por que tomava seis comprimidos de um tapa só. Ele adorava revistas em quadrinhos e disco de rock. Na sala de aula ficava viajando nos quadrinhos e, vez em quando, soltava uma gargalhada que ninguém entendia nada, só eu. Jota era galante e paquerador, e vivia me botando pra cima das meninas. E fazia isso, mesmo sabendo que eu era namorado da irmã dele. Dizia que as meninas gostavam de mim, e que ele arranjava namoradas por que era meu amigo. Mas eu não estava muito aí para as meninas,não. Achava muita dificuldade namorar, para mim era um saco aguentar um namoro. Mas a turma aproveitava, namorava pra caralho. Um dia apareceu a Aninha, transferida do turno da manhã. Aninha era bonita, sorridente e despachada. A turma se deu bem com ela. Me apaixonei por Aninha. E Jota lascou: - "Pô, BD, todo mundo já passou a mão na Aninha, cara!". E os outros quando me viram de mãos dadas com Aninha não acreditaram. Caramba, esse cara é abestado. Pois é, eu quero é ela mesmo Jota, e pronto. Achava Aninha linda, de pele cheirosa. Foi ela quem me ensinou a beijar de lingua. Mas era só eu virar as costas que Aninha se agarrava em outro. Um dia à noite, quando o Colégio realizava um festival de quadrilhas Jota me pegou com Aninha, não sei por que eu já estava com a saia dela na mão. Quando sair de onde estava Jota partiu pra mim; -"Pô, BD, mas tu não faz assim com minha irmã não, faz?" Não, faço não. E não fazia mesmo. Namorei Aninha muito tempo até perdê-la de vista.

O Royal Label que bebiamos já não era o suficiente. Jota estava cada vez mais louco com suas anfetaminas. Ficavamos horas e horas ouvindo rock em sua casa: Rolling Stone, The Who, Santana, Alice Cooper e os cantores country americanos, como Willie Nelson, Jonh Cash, Cat Stevens e Bob Dylan, claro. E tome uisque e pilulas. Willie Nelson era um cantor machonheiro, segundo sua biografia, que faziamos questão de ler, não só a dele mas de todos os outros cantores e conjuntos que nos curtiamos. Então, um dia Jota cismou em fumar maconha. "Topa, BD, fumar maconha?". Topo.

Não foi dificil encontrar a erva que naquele período tinha o apelido de baseado. No fundo já sabiamos a quem procurar, o dificil era pedir. No entanto, nem foi dificil assim. Quem nós deu o primeiro baseado foi um amigo do peito, que vivia enfurnado em seu quarto com seu violão, arrodeado de discos. Nem é preciso dizer que tinha sido ele o responsável pelo nosso gosto musical. Vivia curtindo, além daqueles conjuntos e cantores acima, The Doors, Pink Floid, Emerson, Lake e Palmer, Jimmy Hendrix, The Beatles e a voz gutural de Janis Joplin. No quanto dele tinha um retrato de Jim Morrison, o lider pirado do The Doors, que tinha morrido de overdose. Esse nosso amigo era o Maca. "Pois é, BD, é tu quem vai pedir maconha ao Maca, sacou? Tu tem mais moral". Tenho, caramba! E assim eu fui. Ganhamos dois baseados. O Maca era um pouco mais velho que nós e morava no bairro Marques, na Vila dos Militares. Ele barbariza nas barbas do exército. Tudo normal, irmão, dizia ele. Lembro que era um dia de sabado, e depois de ouvirmos uma sessão de rock na casa do Maca fomos para a casa do Jota. Estavamos ansiosos, afinal de contas era a primeira vez que iriamos fumar maconha. Foi uma curtição ao som de Bob Dylan "Blow in the Wind", e dos Rolling Stones "Angie", sem falar dos Jackson Five, antes de Michael Jackson virar pop star. Depois fomos jogar futebol nas quadras do 25 BC. Sempre faziamos isso. Naquele dia nada nos metia medo, e Jota bolava de rir na quadra mesmo quando levava uma bicuda no meio da canela, deixando os caras sem entender nada.

No ano de 1976, Jota se mudou com toda sua familia para São Paulo. Perdi um grande amigo, mas já sabia me virar sozinho.