quinta-feira, 26 de março de 2020

27 DE MARÇO - DIA INTERNACIONAL DO TEATRO E DIA NACONAL DO CIRCO-PALCO VAZIO E SEM LUZ.


                                        Nestes tempos sombrios, de pandemia e restrições, vou me dirigir àqueles que, como eu, escolheram o palco ou o picadeiro como profissão, e conhecem profundamente o que é isso. Cada um comemora este dia como queira, se há alguma coisa para comemorar. Mas sempre há, nem que seja de forma virtual, com expectadores imaginários, ou comemorar a própria vida. Distanciados um dos outros pelas circunstâncias, coisa terrível para nós, por que gostamos de público,  de sorrisos e de abraços, ficamos a refletir.  
                                          Refletir sobre as dificuldades imensas de produzir espetáculos; Sobre Grupos, Coletivos e Companhias de teatro e de circo morrendo pelas tabelas; Trabalhadores de teatro e de circo, na sua maioria, sem perspectiva e sem horizontes de trabalho; A falta de formação superior da classe, onde não possuímos um curso superior na área; Sim, precisamos refletir. Sobre a inexistência de programas e projetos consistentes para o teatro e o circo no Estado e no Município; Sobre o isolamento cultural, onde os palcos ficam vazios e ás escuras, por falta de espetáculos de fora; Falamos de espetáculos de qualidade, não de enganação da cena.  Sobre a falta gritante de público, onde tudo tem de ser de graça. E assim produtores e artistas padecem no paraíso! E ainda vem uma pandemia e isola criadores e suas criaturas, trancados! Como sobreviver a isso tudo? Dirijo-me, principalmente, aos artistas e produtores, que como eu labutam a dezenas de anos nessa profissão. Mas também dirijo-me aos novos artistas de teatro e de circo que escolheram seguir essa trilha. E, para eles, um recado, aprendam, se fortaleçam e se alimentem da profissão. E sejam solidários aqueles que abriram caminho, e abram caminhos.      
                                        Dia de refletir? Sim! Um dia para refletir tudo o que se disse acima, e um dia para se perguntar por que acontece tudo isso. É bom pensar que não sentamos em mesas de grandes negócios e nem temos câmaras de arte e culturas em nossos parlamentos, de forma concreta. Bom pensar também que somos necessários a toda a humanidade, que sonha e se deleita com nossas criações. Mas somos a parte mais frágil da cadeia no sentido da sustentabilidade. A maioria absoluta dos grupos e coletivos de teatro padece de ações, e o circo está na lona, isto é, no chão literalmente. E os festivais de teatro, as mostras e as iniciativas do setor? Também, na lona a procura de saídas, ás vezes desesperadas.
                                        Refletir, sim, sobre a despolitização do movimento, o medo e o pavor de se expor, quando se trata de reivindicar politicas públicas de cultura seja do município ou do estado, e aprofundar debates local sobre o tema. Onde muitos preferem se isolar, e se enterram em egos, sem se permitir sequer serem questionados. Ou, então, fazem  trincheira em redes sociais ou batem panelas e soltam gritos, dividindo-se em esquerda e direita radicais, contra ou a favor. Denegrindo, muitas vezes, o amigo de classe, esquecendo-se que o inimigo não somos nós, e de que todos tem livre arbítrio, inclusive, os próprios.  No meio disso tudo uma multidão invisível, sem esperança, apenas assistindo o duelo e, talvez, se perguntando - onde vamos parar? E nós, do teatro e do circo, que precisamos sobreviver de nossa arte, a nos perguntar, onde vamos parar, em um estado de mais de três milhões de habitantes e numa cidade de mais de oitocentos mil, que não conseguem as condições mínimas de sobrevivência para  seus artistas. Isso é necessário reflexão.
                                          Resistir. É o que todos nós do teatro e do circo temos feito. Ainda mais em tempos negros e sombrios. Resistir é a palavra chave para este dia Internacional do Teatro e Dia Nacional do Circo. Resistir, em todos os seus aspectos. Lutar coletivamente, dar as mãos e ser solidário uns com os outros, mesmo confinados momentaneamente por uma pandemia. Ser pessoas, ser gente, ser  artistas. Resistir e continuar lutando com todas as nossas forças para sairmos dessa situação de palcos vazios e sem luz. A criação é a nossa prova dos nove, mas precisamos viver plenamente para transmitir alegria. Palavra de todos nós, resistência!

quinta-feira, 12 de março de 2020

JÔNATAS BATISTA - CENTENÁRIO DE NASCIMENTO DO DRAMATURGO.


                                                             (Publicado no Jornal da Manhã, 20.12.1985)


           Jônatas Batista, o homem de letras de espirito combativo e indomável, o poeta de versos revoltados contra o mundo e a solidão, o dramaturgo de veia satírica  e mordaz ao desnudar os costumes sociais da nossa provincia, completou no dia 18 de abril passado, o seu centenário de nascimento. Não é tarde lembrar. Grandes homenagens? Não. Pequenas homenagens? Também não. Afinal de contas trata-se apenas do primeiro dramaturgo piauiense, nascido ainda no século passado, um rapaz metido a ator, um molecote que representava e dirigia seus textos no Theatro 4 de Setembro. Portanto, parece ser essa a visão que os orgãos oficiais de cultura tem acerca do grande dramaturgo. Nada de estranho, pois assim também é a mesma visão que ainda hoje parecem terem sobre nossos artistas de teatro. Para nós, interessa muito saber da vida e da obra de Jônatas Batista como homem de teatro, pois era ai o seu campo de luta.
          Nascido no povoado Natal, hoje Monsenhor Gil, a 18 de abril de 1885, era filho do tenente coronel João José Batista e de dona Rosa Jericó Caldas Batista, e irmão do grande poeta Zito Batista, e um dos mais combativos homem de imprensa do Piauí.Casado com Ducila Cunha, exerceu a profissão de oficial do registro civil e, como poeta, foi um dos fundadores da Academia Piauiense de Letras, e um de seus membros. No entanto, se na poesia o homem manifestava suas imprecações contra o destino, suas angustias secretas de glorificação  á vida, foi no teatro que Jônatas Batista despejou através de seus dramas, operets e comédias, a mais crua e contundente critica á sociedade piauiense. Talvez venha daí a sua biografia quase nunca trazê-lo como dramaturgo, mas sim como poeta e, além do mais, academico. É melhor esconder o lado marginal do imortal da sociedade, e esquecer o dramaturgo que tanto expôs as figuras sociais da capital. Basta ler a revista  de costumes O Bicho, musicada pelo maestro Pedro Silva e que foi vista por quase toda Teresina, para se sentir o perspicaz e vivaz autor de teatro do inicio do século XX.
            Entra o Coro dos Banqueiros:
           "Depositários somos do dinheiro,
            Da maior parte do povo brasileiro,
            Do povo jogador.
            Por isso,é que vivemos fartamente.
            A vida desfrutando alegremente
            Em largo esplendor"
            Por ai se nota que er melhor mesmo conservar o outro lado do homem. Coisa de familia?Pela árvore genealógica é fácil imaginar.
           De uma vida acidentada e tormentosa, Jônatas Batista, aos 18 anos, com a morte do pai, interrompeu os estudos no Liceu Piauiense para viver com seus nove irmãos. Nesta época perseguiu de uma menira firme e obstinada, o oficio de homem de imprensa. Fundou os jornais A Patria,O Mensageiro, O Arrebol, O Operário e O Facho todos pasquins endiabrados, que saiam semanalmente ou mesmo quando se podia pagar a impressão. O certo é que eram todos escritos em ritmo de denuncias, de respostas e, acima de tudo, incentivador de debates e brigas literárias, principalmente contra os inimigos do progresso.Aliás, as richas literárias também não lhe rendiam bons frutos na cidade conservadora, na capital de de preconceitos arraigados.
            Como dramaturgo Jônatas Batista era sócio da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais-SBAT e o seu primeiro representante no Estado do Piauí. Dono de uma vasta obra teatral, contando inúmeras revistas, dramas históricos e operetas, podemos contar entre elas Mariquinha, Teresina de Improviso, Jovta, a Heroina de 1865, Astucia de Mulheres, Cidade Feliz, Frutos e Frutas, Alegria de Viver, Improvisações e Improvisadores, As Crianças, O Bicho, Treze de Maio e a Luta. Coisa de estranhar é o fim que tomaram essas peças de teatro, para encontramos uma foi muita luta e pesquisa. Coisa de estranhar também é que quando pesquisavamos percebemos um certo descaso pela vida artistica  de Jônatas, como se seu oficio de dramaturgo  estivesse sendo escondido debaixo de sete capas. Isso é fácil de compreender. Sua dramaturgia era de forte  conteudo de denuncias sociais, que punha a nu as falcatruas da cidade e a hipocrisia da sociedade teresinense. Sim, a sua veia sarcástica parece ter sido a maldição de ser considerado dramaturgo.
           Mais exemplos da revista O Bicho.
           Sobre a imprensa do Piauí.
          "A imprensa do Piauí
           Não tem ódio e nem capricho
           Eis-nos aqui, eis-nos aqui,
           Fiscalizando o bicho".
          Sobre a policia:
         " Se o dinheiro é curto
           Eu furtar, não furto
          Mas escurrupicho...
          Tiro uma quinzena
          Jogo na dezena
          Pra ganhar no bicho".
          O último exemplo é sobre os costumes da época:
          Não estou dizendo graça
          Nem também falando a toa
          Pelo bicho se desgraça
          Muita dona fina e boa".
          Jônatas Batista, o grande dramaturgo piauiense, morreu em São Paulo, no dia 15 de abril de 1936. Em tempo: houve uma homenagem na Secretaria de Cultura, Desportos e Turismo do Piauí no dia do seu centenário, o lançamento do concurso de Dramaturgia Jônatas Batista, versão 85. menos mal.