Brás do Pedro mal fechou a boca Waldick meteu os sapatos no lamaçal, atolando-se todo. Ele também desceu meio atordoado e fincou os sapatos na lama. O motorista do Toyota e seu ajudante ficaram calados sem saber o que dizer.
- Podem continuar, não se incomodem comigo. Já empurrei muito carro por esse país, até em porta de puteiro- Disse Waldick - Se precisarem de mim estou aqui.
O local do atoleiro era em céu aberto o que ajudava a visão do ambiente e, ao mesmo tempo, a imperícia do motorista. Vendo que a situação não era fácil, Waldick deixou a garrafa de Vodka de lado e meteu a mão na massa, ajudando os dois homens. Começaram a colocar galhos e paus na frente dos pneus do carro, e agora o litro de Vodka passava de mão em mão.
O show do cantor Waldick Soriano estava marcado há mais de três meses, e ia acontecer no Clube do Abacateiro, o maior clube campestre da Roça dos Pereira, distante da capital do Estado cerca de duzentos quilômetros. Parecia que todos os habitantes dos lugarejos vizinhos tinham rumado em polvorosa para a Roça, sem contar o enorme contigente da cidade de Pedro II, ainda incrédulos de tamanho feito. Pareciam não acreditar que Waldick pudesse fazer show em tão insignificante lugarejo. A única rádio da cidade tinha passado os últimos dois meses fazendo programação especial sobre a vida do cantor: eram concursos, gincanas e perguntas que premiavam os ouvintes e fãs. Não é preciso dizer que foi um verdadeiro inferno de gente aos borbotões invadindo a estação atrás de participar das promoções. Sem contar que o Clube Abacateiro, nome só de fachada, por que na realidade acobertava mesmo era um cabaré de terceira categoria, tinha recebido pintura nova e luzes coloridas. Portanto, tudo estava a mil para receber o grande cantor.
Brás do Pedro, o promotor do evento, quando saiu da capital com o cantor a bordo do Jeep tinha ligado para o radialista Chiquinho Aguiar assegurando que Waldick Soriano estava chegando á Roça dos Pereira, e que a festa seria de arromba.
Mas agora ali atolado an estrada, metido num lamaçal desgraçado até as canelas, não sabia o que ia acontecer.
- Vamos lá pessoal! Caralho, já estamos atrasados para a festa, pombas! Gritava ele aos berros.
- Isso aqui num vai ter jeito bicho - Disse Waldick calmamente sorvendo outro gole de Vodka e olhando para as estrelas.
Decidido a chegar de qualquer jeito na Roça dos Pereira, Brás do Pedro propos a Waldick que caminhassem até os Lajedos, que ficava a uns três quilômetros, e de lá com certeza pegariam outra condução cedida por seu amigo de infância, Zé do Pão. O cantor não se fez de rogado e ganhou a carroçal com Brás do Pedro, deixando o motorista e o ajudante na estrada, sujos como dois porcos na lama.
Brás do Pedro ainda esbravejou:
- Caramba, eu espero que vocês desatolem este carro até amanhã, picas!
Brás do Pedro levava a maleta de Waldick, que continuava com o litro de Vodka na mão. No caminho não houve lamúria dos dois sobre aquela situação, pelo contrário, falaram de mulheres, noitadas e das andanças do cantor pelo Brasil afora.
Em pouco tempo deram com a venda de Zé do Pão, que naquele momento estava apinhada de homens, e de algumas moças, bebendo e conversando alto, pois todos se preparavam para chegar até o Clube Abacateiro. Brás do Pedro para poupar o ídolo entrou na quitanda sozinho.
- De quem é aquela caminhoneta parada ali fora? Perguntou de vez.
- É nossa, ora! - Adiantou-se seu amigo Miguelzinho Aguiar.
- Meu amigo preciso alugar esse carro até o Clube do Abacateiro, com urgência!
- Pois é pra lá que nós vamos, Brás do Pedro...
De tão assustado que estava Brás do Pedro não percebeu a gafe que dera, não reconhecendo o amigo Miguelzinho.
- Meu amigo Miguelzinho me perdoe!
- Não há de que, homem. Parecia que viu uma alma.
- E vi mesmo.
Brás do Pedro puxou o amigo de lado e começou a contar o que estava acontecendo.