quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

O PRIMEIRO ROMANCE



         Corria o ano de 1965. Minha família tinha chegado do Maranhão,de retorno para o Piauí, no ano anterior. Morávamos no bairro Piçarra, a menos de um quarteirão da Avenida Miguel Rosa, de onde avistávamos o Cine São Raimundo, chamado de Baganinha. Foi nesse cinema que assisti muitas vezes o humorista Zé Trindade, um dos maiores do Brasil.
          Eu e minha irmã estudávamos no Colégio Miguel Borges, no bairro do Barrocão. Lembro que, quando chovia, aquele bairro realmente se transformava num imenso córrego de águas barrentas e caudalosas de meter medo a qualquer um. A água era tanta, que muitas vezes,os alunos do colégio não podiam sair e ficávamos ilhados dentro da escola, até a correnteza passar.
          Eu era uma criança frágil, um menino magricela, que sofria de asma e muito suscetível a outras doenças. Por isso, sempre tive um comportamento mais contemplativo, meio solitário, no entanto, jamais de solidão, isso por que eu tinha uma imensa capacidade de sonhar. Vivia sonhando com tudo que era bom, e isso me dava uma imensa vontade de viver.
         Naqueles anos,o governo americano, através de um programa de cooperação com o governo brasileiro, mandava merenda para as escolas públicas do país. Os alunos faziam festa. Era leite em pó feito com uma mistura de néscau que era apelidado de pau de índio. Esse leite, a merenda escolar mais comum,  era acompanhado de um pãozinho pequeno, que quando estava duro, os alunos faziam a guerra dos pães dentro das salas.Um deus nos acuda. E eu só olhava, quieto, na minha.
            Foi numa manhã, não me lembro de que dia, que dei com o livro lá em casa. Era o romance Crime e Castigo, um calhamaço de mais de seiscentas páginas, de um escrito russo chamado Fiodor Dostóievsk. Comecei a ler o livro imediatamente, e aquele enredo me cativou tanto que eu não esquecia um só minuto do livro, e quando estava em casa, e meu irmão não estava lendo, por que o livro tinha sido trazido  por ele, ficava ali impaciente aguardando minha vez.
          Na escola, durante a leitura daquele romance, eu ficava pensando na história e qual seria o destino daquele personagem insólito, e minha quietude ainda era maior o que fazia com que minha professora, dona Jacira, várias vezes colocasse sua mãe em minha testa perguntando se eu estava doente. Realmente, durante a leitura do livro eu sentia o corpo quente, febril.
           Ao terminar aquele romance Crime e Castigo eu não tinha dúvida, seria um escritor de romances. Melhor ainda, eu gostaria de me parecer com aquele escritor, que na contra capa daquele livro estava de barbas longas,umas enormes olheiras e um bigode bem tratado. Não me lembro se era uma foto ou uma pintura, só sei que queria ser ele e escrever um romance. Coisa que depois de quase cinquenta anos ainda não conseguir escrever, um romance. Mas continuo tentando. 
               

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

SINDICATO DOS ARTISTAS E TÉCNICOS DO PIAUÍ - SATED-PI, COMO NASCEU.


         Corria o ano de 1988 e o movimento de teatro amador do Piauí estava um tanto fragilizado naquele momento quando, só para dar um exemplo, existiam duas federações representando o teatro do Estado, o que para a própria Confederação Brasileira de Teatro Amador, entidade representativa da classe a nível nacional, era um absurdo. Foi no final daquele ano que tivemos a ideia de começar a discutir a criação de um orgão que representasse os profissionais do teatro do Piauí, tendo em vista a existência de alguns Sindicatos de Artistas e Técnicos no Brasil. 
         A primeira providencia que tomamos foi reunir algumas pessoas para discutir a proposta, não queríamos nem pensar da resistência que poderia haver. Houve dois, três encontros,então,lembro que foi formado uma comissão para elaboração de estatutos da entidade de classe que por consenso, naquele instante, se chamaria Associação Profissional dos Artistas e Técnicos em Espetáculos  de Diversões do Piauí - APATED-PI. Eu, José Nazareno e Wellington Sampaio formamos comissão para escrever os estatutos. Já corria o ano de 1989, e as discussões avançavam. Foi, então, que houve um seminário Sobre Propostas Para a Área Cultural, aqui em Teresina, promovida pela Secretaria de Cultura do Estado -Fundação Cultural do  Piauí. Para o evento veio, como conferencista, a produtora cultural Iara Sarmento, de Minas Gerais, ligada ao Sindicato dos Artistas daquele Estado. Numa conversa que tivemos com Iara ela nos esclareceu que o melhor seria criar logo Sindicato dos Artistas e Técnicos do Piauí e não apenas uma Associação, que não teria força de lei para defender os artistas e técnicos profissionais. Era o que faltava para nós.
          Portanto, a ideia da Associação foi abortada e apenas transformamos seus estatutos nos Estatutos do Sindicatos dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado do Piauí. Criado no ano de 1989, nas dependências do Theatro 4 de Setembro, o Sated-Pi,  nasceu sob a desconfiança dos amadores, que viam na sua existência uma ameaça a classe. Lembro que Pierre Baiano, um ator muito conhecido por todos os amadores do Estado, fez um discurso exaltado condenando a criação do Sindicato. Mas a entidade foi criada, ainda que com apenas treze pessoas assinando a ata de criação. Fui eleito o seu primeiro presidente e para o registro do Sindicato na Delegacia Regional do Trabalho foi uma verdadeira via crucis, já que tínhamos que provar primeiro que éramos profissionais. Foi uma burocracia enorme. Meu registro profissional foi o de número um, a partir daí passamos a filiar outros profissionais.
        Criado o Sated-Pi a luta foi intensa para mostrar verdadeiramente a sua necessidade.Fizemos a ponte do Piauí com diversos Estados que já tinham Sindicato, comparecendo a congressos, seminários e foruns, mas não fomos capazes de mostrar aos profissionais de teatro e dança do Estado a real força da entidade, nem mesmo para os profissionais técnicos do Theatro 4 de Setembro. Apesar do Sated-Pi ter filiado quase todos as pessoas de teatro e dança do Estado patina entre a incompreensão e o descrédito.Mas isso se deve muito mais ao mercado de trabalho e a própria desvalorização, claro, dos artistas e técnicos para com seu orgão de classe.
          Como a pessoa que difundiu a ideia de criação do Sated-Pi, e foi seu presidente por três vezes, acreditamos no Sindicatos dos Artistas como orgão de classe, e temos certeza de sua importância. Basta valorizar e acreditar.