sexta-feira, 2 de agosto de 2019

SANGUE E CERVEJA


       Era desses domingos de manhã de sol resplandecente. Bem que poderia aproveitar, talvez um clube, piscina. No entanto, optou por uma cervejinha no bar de sempre, com tira - gosto de peixe. 
       Se alguém conhecesse o inferno diria que estava lá. Estranho. Aquele bar não costumava receber tantos fregueses numa manhã de domingo, mas estava lotado. Quis dar marcha ré, mas o garson o tratou como um freguês antigo, arranjou um local para ele sentar. Mesmo assim sentiu que tinha entrado numa roubada, o bar tinha se transformado em um campo de futebol, melhor dizendo, em um ringue de jogo de bola. Mas domingo as dez horas? Deus do céu! Já não basta futebol dia de segunda, terça, quarta, a semana toda? Fazer o que, é o país do futebol.
       Não tinha essa paixão toda por futebol. Essa cegueira, estúpida alienação, que deixa muitas pessoas transtornadas, tresloucadas, alheios ao mundo, pior dos que os viciados em redes sociais. Gostava, e só. Portanto, ao sentar-se naquele bar não teria outra opção, a não ser observar atentamente o comportamento de algumas daquelas pessoas que estavam ali. E isso ele adorava fazer. Era um inveterado na arte da observação, e de ouvir.
        Chamava a atenção que em todo o bar tina apenas dois casais. Pobres mulheres acompanhando namorados ou maridos, era como se não existissem. Então, tome celular, redes sociais. Cara direto nos aparelhos como se nada mais existisse ali. Ainda bem.
          O nome mais social que os torcedores berravam bem ato, era porra!Tomar no cú era fichinha. Filho da puta, um balsamo. De repente chega um cidadão e se dirige direto para uma mesa de um dos casais.
        - Aquela vaca tá pensando o que?Falava nervoso - Vou dar um tiro na cara dela!...
           Ninguém prestou atenção a ele.
       - Senta aí, moço, toma uma cerveja. Assiste o jogo! Disse o amigo da mesa.
        - Deixa ela chegar aqui com aquela cara lambida, deixa. Vai enganar outro trouxa, eu não!....
          O homem sentava e se levantava. Ia até a saída do bar, olhava para a rua e voltava para o mesmo lugar.
         A torcida explodiu com um lance do jog.
       - Porra, caralho, mete essa bola filho da puta!...
       - È foda, cara a cara com o goleiro...Vai tomar no cu perna de pau!...
         O cidadão nervoso não via o jogo, e repetia sua lenga-lenga junto ao casal. Casal que não ligava para ele. Até que gostaria de falar com aquele cidadão, mas preferiu observar as coisas, tomando sua cerveja, e atento e tudo.
         A zoada era infernal. 
       - Filho da puta passa essa bola, corno...
       - È um mercenário do futebol, mascarado todo...
         De repente veio o gol. O bar estremeceu do teto ao chão.A torcida se confraternizava.
      - Chupa essa, Tonhão, chupa!...
      - Meu pau, meu pau...Devia ser o próprio Tonhão falando.
        Foi quando ele notou no meio daquela algazarra que uma mulher entrou no bar, e se dirigiu a mesa onde estava o cidadão nervoso. Mas não deu tempo dela se sentar. Foram três furadas rápidas na altura do torax, sem chance alguma. A mulher desabou levando consigo a toalha da mesa e várias garrafas.
       Alguém gritou com deboche:
     - Bota na minha conta, caralho!
       O cidadão nervoso já tinha saído tranquilamente pela porta da frente do bar. Quando perceberam  que a mulher estava morta, pipocaram fotos dos celulares.
       O jogo continuava. Para o bem de todos.

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